She looks up and there in a golden ray of light


 Dor. Cansaço. Desgaste. Abatimento... Era isso que vinha lhe atingindo desde os últimos instantes. Seu primeiro plantão desde que começou o curso e era em um dos maiores hospitais de uma das maiores cidades do país...Era uma amante da noite. Boêmia, louca, solta... Baladas, bares e festas todas as noites que foram abandonados e trocados pelas várias horas em frente à luminárias, canetas e livros gigantes que a faculdade lhe acarretava. Tinha decidido pouco depois de começar o curso de engenharia que largaria este para fazer medicina. Engenharia parecia ser o curso perfeito, mas depois de ver um de seus amigos morrer por demora da ambulância. Foi obrigada a ouvir “Se tivéssemos chegado um pouco antes, ele teria maiores chances.” Desde aquela noite pensava que se por acaso algum médico estivesse por perto seu amigo poderia ter sobrevivido por ter sido atendido à tempo.
Tinha sido a pior noite de sua vida, de seus 19 anos de vida. Mas aquela noite, aos 24 anos, que tinha acabado de encarar, com certeza tinha se superado em todos os possíveis quesitos de “pior” que haviam para serem superados. Uma moça de no máximo 20 anos com uma pequena barriga em formação tinha chegado na UTI em uma ambulância. Tinha luxações, uma fratura, vários hematomas, infinitos arranhões e o bebê parecia estar morto, não se movia e quase não tinha pulsação...Algumas horas na sala de cirurgia como ajudante e no meio da cirurgia pediram para que ela se retirasse e fosse conversar com os pais da garota que estava ali na sala de espera. Era novata e simpática consequentemente a melhor pessoa para conversar com os pais desesperados da garota. Sem opção, foi.
Descobriu que a garota tinha 18 anos e estava grávida há três meses do namorado de escola. A mãe ria nervosa, como se não soubesse o que dizer, e o pai insistia que era culpa desse namorado dela. Dizia que ele a espancava e que naquela vez a briga tinha ido tão longe que ele a tinha empurrado da escadaria da casa e que o bebê tinha morrido. A mãe discordava com aquela risada insegura e dizia que eles eram ótimos juntos e que ela só tinha tropeçado e caído por isso estava daquele jeito. A jovem médica não conseguiu acreditar de maneira nenhuma no que a mulher estava lhe dizendo, não passava confiança. Mas também não conseguia acreditar no pai porque o pai poderia ser daqueles que não quer ver a filha longe de casa de maneira nenhuma. E a única coisa que tinha certeza é que a garota estava em um estado grave e que tinha caído da escada. Horas e mais horas se passaram enquanto ela tentava acalmar os pais que aguardavam completamente aflitos na sala de espera. O médico responsável saiu após 5h de cirurgia e de uma longa bateria de exames e foi até a sala onde aguardavam dizer que a garota estava viva, mas não o bebê. A queda tinha o afetado e então morrera ao chegar ao hospital. A mãe da garota chorou pela perda do neto e o pai tentou se acalmar e perguntou insistentemente ao médico se poderiam ver a filha e foram liberados, juntamente com a residente que foi para um corredor vazio e isolado, junto de mais alguns colegas, para poder descansar um pouco. Um rapaz grande e mal encarado tinha surgido também, querendo ver a garota e ela descobriu que era o tal do namorado dela e pôde ter certeza que aquele cara tinha no mínimo 30 anos...
Deitou em uma das macas disponíveis no corredor e se arrumou para poder dormir, mas quando seus olhos foram pregados pelo sono, lhe biparam para o caso da moça que caiu da escada. Quando chegou ao quarto, o namorado da moça estava dizendo que queria leva-la para casa enquanto os pais estavam encolhidos em um canto, com medo, aceitando o que o cara dizia.
Aquilo tinha sido extremamente forte em seus olhos e era mais forte ainda por não saber o que realmente tinha acontecido com aquela moça ou o que tinha acontecido em todos os dias que ela havia elegido como os piores de sua vida...

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