Postagens

Mostrando postagens de 2015

Os amantes

Imagem
Que partam. Todos já foram e apenas os amantes ficaram. Todas as cortinas já desceram e apenas eles ficaram em sua exposição e sujeira. Apenas eles, em suas faces cobertas, mantiveram-se de pé enquanto os outros foram ao chão. Apenas eles mantiveram-se firmes no erro cometido. Os amantes eram bons. Sempre foram. Sujaram-se por divertimento. Ninguém viu suas faces mas todos sabiam que riam, que desfrutavam dos traídos. Se expuseram com as pernas firmes e sem fraquejar, ainda eram amantes, mesmo que todos tivessem descoberto. Alguns defendiam que a vida em casa era difícil, mas todos sabiam que não haviam desculpas suficientemente plausíveis para tal ato. Os outros estavam mais arrependidos do que eles e nada os incomodava. Os amantes não sentiram vergonha, desprezaram aqueles que injuriaram-se com suas faces cobertas. A camareira foi quem os encontrou a priori. Fora a face, nada mais estava coberto. Despiram-se de toda a vergonha e de todo pudor e nada mais restava quando foram pe

Aqui jaz a pior parte de mim

Imagem
Contabilizou. Era seu quinto amor que terminara e a quinta vez que se reconstruía parte por parte em busca de uma melhora pessoal que a fizesse superar plenamente a perda. Era a quinta vez que retirava fotos de porta-retratos, que borrifava seus próprios perfumes nos pelúcias que ganhara e pelos que tinha menos afeição, enviava-os para a caridade. Alguém viria a fazer um uso melhor deles do que a lata de lixo. Revirava a casa na esperança de não haver mais nenhuma peça do dito cujo perdida em uma das madrugadas pois isso pouparia algum momento bem desagradável, onde ela tivesse que entregá-la ou pedir para alguém que o fizesse. Colocou as roupas que tinham o cheiro dele impregnado – especialmente as do último encontro – para lavar e não se daria por satisfeita enquanto a aroma não saísse. As fotos sempre eram a pior parte. Muitas foram reveladas e adornavam suas paredes. Algumas poderiam ser cortadas e de nada modificaria seu rosto ou o contexto, outras não. Ele aparecia tão per

E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim

Imagem
Olá amigo, lembra-se de mim? Há quanto tempo não escrevo, não é? Publicar um texto se tornou mais simples do que a velha, boa e conhecida carta manuscrita, sabemos bem disso, não é? Uma pena, gostava muito do sentimentalismo e da emoção que se era possível transferir em algo manuscrito. Manuscritos sempre serão melhores do que datilografias e digitalizações. Sabe bem disso até hoje, não é? Mas bom, vamos ao que realmente importa, o porquê tudo se acabou, correto? Acho que teve uma tal de traição ai no meio não foi? Como amigo não era você beijando alguém que me incomodou. Que matou a amizade. Não foi esse tipo de traição e você tem uma boa compreensão é conceito disso, correto? Mas posso explicar de maneira bem mais prosaica, como você bem sabe que gosto de fazer. Esses dias vi um filme que lançou recentemente, O pequeno príncipe. Provavelmente todos já leram – pode rir – mas eu nunca. Depois do filme, pode ser que darei uma chance a este. Merece. Em certo momento há pala

Desencargo

Imagem
Me fale de café, de versos, de poesia de bar, de música inacabada e violão sem corda, mas não me venha falar de amor não duradouro se tudo acabou naqueles versos naquele dia no café. A enxaqueca atacou e não manifestei minha dor. A gastrite também me machucou, mas nada disse eu se tudo isso era culpa que tu me destes. Ah, nesse frio de outono tomando café no fim da tarde e te escrevendo versos que nem se um dia tu lerás, me finjo de inteligente usando palavras difíceis para lhe escrever um versinho que caiba bem os sentimentos.  Ah querida amiga não se dissolva por palavras bobas e fáceis, esses teus versinhos só são bonitos quando são escritos para ti, de outro modo não. Tu és ciumenta e acha que largar-te-ei por outra moça qualquer por ai. Moça da vida tu não és, mas dizem ter vocação. Moça da vida tu não és, mas sabe todos os ensinamentos destas. Moça da vida tu não és, mas tem sentimento de sobra que nenhuma delas tem. Menina que acabou de virar moça que me veio falar de c

The answers to your dreams are running in the crowd

Imagem
Detestava grandes aglomerações, sempre detestou, mas tinha que voltar para casa e aquela era a melhor maneira. Não estava de bom humor, o cansaço pesava em seus ossos e a aglomeração criava um ambiente claustrofóbico que lhe pesava os ombros. Esperava não demorar tanto a chegar em casa porque realmente sentia uma necessidade quase desesperada de jogar-se no sofá e apenas olhar para o teto até que a sensação de cansaço cede-se minimamente. Sentia como se aquele dia fosse uma pequena amostra do inferno e a única coisa que lhe faria bem seria sua chegada em casa. O fone de ouvido gritava algo que não tinha capacidade de concentrar-se por estar tão impaciente, portanto batia a frente do sapato e olhava inquietamente à seu entorno. Um outro homem, tão engravatado quanto o este, encontrava-se tão impaciente e inquieto quanto e carregava além da valise, um bouquet e olhava o relógio metálico em seu pulso com frequência, como se assim fosse possível acelerar o tempo. Uma mãe brincava co

#45 de 100: À meu eu de 13 anos de idade

Imagem
Olha, eu sei que dói. Que incomoda, fere e machuca. Que te arranca um pedaço a cada vez que você ouve alguma coisa dessas, mas tem uma coisa que você tem que aprender: isso passa. Na verdade, não é só isso que você tem que aprender. Tem um quinquilhão de infinidades de coisas que você precisa aprender, mas essa é provavelmente a mais importante por englobar boa parte das coisas que você vai aprender até o seu presente, vulgo eu, aos quase 20 anos. Cada coisa que te falarem te criticando, reclamando de ti, dizendo que você não é suficientemente isso ou aquilo, você vai ignorar. Não vai ser agora -- porque ainda é uma criança -- mas aos pouquinhos você vai aprender que não vale a pena ouvir NADA disso, e que ainda ouvirá coisas piores mais pra frente -- do tipo "essas daí nem parecem gente" -- e em algum momento desse ano que está te doendo tanto, você vai ver pessoas falando que seu cabelo -- que você não lavou no dia anterior por alguma impossibilidade -- estará maravi

Just remember who I am in the morning

Imagem
Acendeu um cigarro, caminhou tranquilamente pela sala até a janela, encarando a estante lotada de livros e a enorme TV posicionada no centro oposto da parede. Tanta informação que lhe vinha e mesmo assim tinha tais lapsos de sentir-se perdida e sem saber para onde ir. Debruçou-se no parapeito e observou o movimento lá embaixo. Tão pequenas e tão miúdas. Movendo-se freneticamente em destinos desconhecidos que quem os observava tão distante daqueles infindáveis mundos nunca saberia. Nem havia qualquer porquê que fosse, também. Encarou os livros mais uma vez e refletiu mais um pouco. Gostava de escrever alguns rabiscos por ai. Mas gostava muito mais de ler algum rabisco que alguém um dia compilara e encadernara e colocara em uma livraria ou em um sebo qualquer, de maneira bem conservada. Cansava-se de conviver apenas com a própria história e gostava de ouvir as histórias, as dores e os pecados alheios. Fazia com que se sentisse mais humana. Menos incorreta ou deslocada. Desloca