Mercador de Veneza

O mercador remava seu barco pelos canais que entrecortavam a cidade, as águas azuis esverdeadas se espaçavam levemente conforme a gôndola ia por entre os mesmos e a brisa suave atingia-lhe o rosto enquanto o mesmo anunciava seus produtos. Era conhecido pelas frutas mais frescas da cidade italiana e todos vinham às margens dos canais para lhe buscar a mercadoria, fosse para o café, para o almoço, para os lanches, ou para a janta. O importante é que todos iam até ele...
Era solitário, um prazeroso solitário, tendo companhia apenas de suas mercadorias e suas lembranças. Morava em um barraquinho próximo à seu fornecedor e só ficava em casa quando todas as portas de Veneza se fechavam ou quando se deparava com fortes chuvas que poderiam estragar suas mercadorias. A vida era simples, mas lhe era agradável e ele nunca se preocupara com nada que não fosse isso.
A mãe falecera junto ao nascimento de seu irmão mais novo e seu pai quem criara os dois filhos. Ele não tinha vocação para ser "mãe-e-pai", mas como pai, e como ser humano, era um bom homem e os criou bem, na maneira do possível. E ele saíra de casa aos 18 anos para sair pelo país para saber o que fazer da vida, tendo conhecido todos os tipos de pessoas, tendo as vezes dormido nas portas dos bares pois estas lhe traziam a cobertura necessária à chuva e tendo outras vezes que dormia em hotéis luxuosos porque tinha conhecido pessoas poderosas que lhe deram um quarto para dormir durante uma noite.... 
Tinha vivido tanto em tão pouco tempo...
Quando decidiu retornar, aos 25 anos, tinha uma aparência razoavelmente saudável e seu pai estava doente, sem condições físicas para trabalho, fazendo com que o mesmo decidisse assumir o cargo enquanto o mais novo procurava alguns bicos por ai para poder bancar alguns remédios para o doente homem. O mais velho aproveitou-se da beleza que exalava de seu corpo e rosto para chamar atenção das moças casadoras da região, que convenciam seus pais a levarem-nas até os canais para que pudessem ver o novo mercador de pele suavemente bronzeada e cabelos negros que cruzava a cidade em uma gôndola recém reformada, vendendo as melhores frutas, verduras e legumes que já viram um dia em vida. Aumentando assim, a renda arrecadada e tendo condições de pagar os remédios para seu pai, que veio a falecer cinco anos mais tarde...
Sua renda vem se mantendo estável desde então, e agora com 50 anos, continuava se mantendo razoavelmente bem, enquanto o irmão mais novo fora para Roma estudar, ele preferiu se manter ali, em sua pacata humanidade...

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