I'm destined for anything at all

Pegamos o metrô quase à meia noite, era o último trem e não tinha mais quase ninguém dentro do vagão, só duas garotas com o sapato na mão, tropeçando por ai e rindo escandalosamente, denunciando o quão bêbadas estavam. Uma delas vai cair logo logo, você me disse enquanto elas tentavam chegar no assento dentro do metrô novo, logo ao lado do assento azul claro. Uma das garotas ainda estava com um pé de salto, e foi ela que caiu. Bem de cara no chão, choramingando que aquilo doía e que ia estragar a maquiagem dela. Exatamente como você disse.
Era o último vagão e quase ninguém embarcava lá. Mal tinham pessoas nas estações e muito menos naquele em que nos localizávamos, ele seria nosso se as duas garotas não estivessem lá, na verdade.
Você estava todo folgado com as pernas esticadas e os pés em cima do banco azul claro e eu estava do mesmo jeito, com o corpo deitado em cima da minha mochila que estava encostada abaixo da janela, e finalizando aquela garrafa de 600 de Coca que compramos antes de embarcar.
Quero fazer algo estranho, eu lhe disse e você colocou os pés no chão, como se fosse prestar atenção na minha explicação devido à sua falta de entendimento, Quero fazer algo estranho sabe? Algo que não se pode fazer normalmente, mas que eu poderia fazer agora por não ter ninguém por perto, exceto as duas lá que não vão lembrar do que aconteceu amanhã.
Você riu e me jogou mais uma das suas eternas ironias "Existem tantas coisas estranhas à se fazer quando as pessoas não estão olhando. Eu poderia te comer aqui e isso entraria na categoria e não nos pegariam. Poderia até fazer um strip tease num desses balaústres que ninguém ia estranhar". Sua ironia sempre me fez rir, principalmente por ser uma péssima ideia, então enquanto ríamos da piada, pensei no que poderia fazer, e decidi depois de começar a sentir meu diafragma completamente dolorido pelas contrações subsequentes. Coloquei os pés no chão e fui ver se a proximidade das portas estava muito sujo e enquanto você me observava, tentando descobrir qual minha intenção com isso. Sentei-me ali. A mochila colada ao banco e a parede e as minhas costas encostadas na mochila. A porta desse metrô novo é mais larga então você se sentou na ponta oposta da porta e nós fechamos a parte baixa dela com as pernas. 
Você deu risada e falou que eu tinha problemas e eu dei mais risada ainda e falei que você tinha tantos ou mais problemas que eu porque andava comigo e me tratava como se eu fosse a pessoa mais normal do mundo. Continuamos rindo, só que mais da risada do outro do que do fato de estarmos sentados no chão do último metrô do dia, ao lado da porta, até o momento em que uma das garotas gritou, lembrando que haviam acabado de passar da Ana Rosa e que era ali que tinham que descer para ir para a Verde.
Rimos delas e elas saíram correndo e ficaram batendo na porta depois que ela se fechou para poderem sair, mas só puderam na Vila Mariana, e continuaram agoniando até lá. E nós rindo.
Elas saíram e continuamos rindo, mas de repente as coisas ficaram sérias e eu comecei a pensar em tudo que se passava entre nós e você continuou me olhando sério, quase sem piscar e sorri. A voz eletrônica anunciou nossa estação e descemos e eu pensando que talvez nunca tivesse sido tão boba antes...

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