Little devil

Construiu sua reputação na rua, na noite, na vida.
Todos sabiam seu nome, mas ninguém sabia seu nome ou sobrenome de batismo.
Todos sabiam seu rosto mas ninguém sabia como chegara ali. Ou o que fizera para chegar ali.
Só sabiam da reputação de fumaça, da velocidade com o qual aparecia e desaparecia. Ela era um fogo de palha, apagava tão rápido quanto começava e ninguém a retinha em mãos. Era um caso raro e inigualável. Todos a queriam. Todas queriam ser ela. Mas nenhuma sabia ser, não daquela maneira que só ela sabia ter. Era um diabinho e todos sabiam. Não abria as pernas para qualquer um e não cobrava. Sabia dos apelidos que recebia mas nem importava, ela sabia quem era e o que fazia para ser quem era.
Ninguém sabia onde morava ou o que fazia no resto dia, só sabiam que ela era a atração mais aguardada da casa que anunciasse estar. Era só ela avisar que estaria em tal festa que filas de quarteirões de comprimento se formavam e quem era ela?
Todos sabiam, mas ninguém sabia.
Prostituta? Socialite? Modelo? Tiete? De que importava? Ela era ela.
Tinha um nome mas andava com um colar de outra inicial no pescoço para todo lugar que ia. Seria a inicial de seu nome de batismo? Ou do nome que constava no RG?
De onde bancava tantas baladas caras? Não esbanjava, mas todos sabiam que ela tinha poder. Ninguém sabia o valor de seu capital, mas sabiam que ela podia e que podia muito. Porque talvez fosse rica, porque talvez fosse conhecida e tivesse contatos, porque talvez tivesse amantes poderosos... Ninguém sabia e ela continuava querendo que isso fosse um mistério.
Os amantes? Poderosos em aparência, mas não necessariamente monetariamente poderosos. Ela tinha contatos o suficiente para fazer o mais pé-rapado dos amantes parecer um príncipe recém saído de um conto de fadas. Mas obviamente se encarregava de deixar o mistério no ar para quem fosse externo a sua vida, a aparência de príncipe era nas festas, fora das festas? Pra que se preocupar.
Namorados? Tinha coisas mais importantes para se preocupar do que meros namorados que -- em sua mente -- só atrasariam seus planos de vida. Havia muito a ser feito em muito pouco tempo. Mas quem saberia disso? Era um mistério para todos à sua volta.
Mãe? Pai? Família? Ninguém sabia nada a respeito destes, só ela. Não interessava que soubessem. Eles eram uma parte de sua vida que ela não queria ninguém se aproximando. Não por vergonha, mas sim, segurança. Tendo muitos contatos, tem-se muitos inimigos...
Porém, ninguém de fora sabia.
Mas tantos drinks eram oferecidos-lhe, tantos machos cobiçando a fêmea mais astuta da matilha... Ah, pobres rapazes, não sabem o quanto enganados eram.
Tantos drinks, tantas pílulas e comprimidos inseridos em bebidas que ela já os identificava sem esforço ou trabalho... De praxe. Uma moça tão conhecida obviamente receberia muitos convites e a faculdade de farmacologia a fizera aprender todos os tipos de droga que poderiam algum dia lhe oferecer. Mas ninguém sabia de seu currículo, era mais um mistério que pairava à seu redor.
O diabinho aparecia de noite de de noite sumia em suas requintadas e alternativas vestes. Portadora de extrema elegância, ninguém a subestimava porque ninguém sabia quantos contatos tinha ou o que poderia fazer com os mesmos.
A festa acabou 04h da madrugada e então ali estava ela saindo, desfilando por ai com seu coturno, shorts desfiado, uma jaqueta que parecia ter sido pega de algum amante, um boné de aba reta e uma camiseta de laterais rasgadas dos Rolling Stones, aparecendo o sutiã preto de renda.
E quem achou que ela estava bêbada, muito enganado estava.
Ela nunca gostou da bebedeira, sempre preferiu ver os outros bêbados para poder se divertir sabendo de coisas que ninguém se lembrava mas que ela lembrava.
Esse era o espírito da diversão pra ela.
Ela era um mistério e todos queriam saber quem era aquele mistério.
Mas como todo bom mistério, ela nunca seria revelada...

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